30/07/2010

A festa da foto

Tenho algumas lembranças muito nítidas da minha infância e da adolescência. O tempo que a gente passava na rua, as horas que eu e meus amigos passávamos à toa, conversando e vendo a vida. São lembranças muito agradáveis e elas estão cada vez mais raras.

Acho que isso se deve em parte ao surgimento da câmera digital. Bem, a culpa não é propriamente dela, mas da obsessão que adquirimos por tirar fotos. Me incluo no grupo dos que perdem boa parte dos encontros e festas tirando fotos.

Tirar fotos tornou-se um tipo de evento obrigatório em qualquer ocasião. Teremos muitas fotos para nos lembrar de quando... tirávamos fotos!

Com a criação do twitter a coisa tem ficado ainda pior. A pessoa não só perde minutos preciosos tirando fotos como perde mais alguns postando as benditas fotos na internet só para dizer ao mundo "Olha como estou me divertindo".

Ainda tento entender o quão divertido pode ser tirar fotografias ensaiadas de si mesmo. Ou quantas coisas engraçadas existem dentro de um banheiro. Dezenas de fotos e a pessoa com a mesma cara em todas. É a garantia de que a foto sairá boa o bastante para ser publicada.
Para os intensos como eu, ainda perde-se a oportunidade de se contar casos fantásticos e obviamente exagerados. Sempre existirá uma foto para provar o contrário.
Bem, quero deixar claro que não sou contra as fotografias. Muito pelo contrário. Admiro muitíssimo uma bela foto. Mas sou ainda mais fã da espontaniedade, da diversão e de vivenciar histórias que fiquem para a posteridade.

25/07/2010

Detalhes


Eu sei que esses detalhes vão sumir na longa estrada do tempo que transforma todo amor em quase nada, mas "quase" também é mais um detalhe. Um grande amor não vai morrer assim, por isso de vez em quando você vai lembrar de mim.
Não adianta nem tentar me esquecer...
Roberto Carlos

21/07/2010

Rush

19:00h. Normalmente ele esperaria mais um hora para sair. Nesse dia ele resolvera enfrentar o caos do trânsito no horário de pico da metrópole. Ele ligaria o som em uma rádio que tocasse uma música animada e ficaria olhando as pessoas com os nervos à flor da pele enlouquecerem nos carros ao lado. Ele precisava arrumar algo para ocupar a mente. Não que estivesse atolado em problemas ou que algo estivesse tirando suas noites de sono. Era justamente o contrário. Estava tudo muito tranquilo. A vida estava muito boa. O coração já estava quase em paz, havia sido promovido no trabalho e em casa o clima não poderia ser melhor. Como isso o incomodava! E o incômodo ainda lhe fazia sentir-se culpado. O que havia de errado afinal com o sossego? Não conseguia sentir-se confortável, mas sabia que momentos de paz como esse eram raros em sua vida. Ele havia se acostumado em viver intensamente e tinha aprendido a ser feliz assim.
Tinha decidido logo jovem que tudo em sua vida seria grande. Lembrava-se de sua mãe dizendo que tudo na vida passa, a dor e a alegria e não sei mais o que, conforme está escrito na Bíblia. Ele tinha entendido que, na verdade, o que levamos são as lembranças, que os momentos especiais duram muito pouco, mas as sensações provocadas pelas recordações, essas sim eram quase infinitas. O que atrapalhava era sua memória nada confiavel e acabava sempre por esquecer o que lhe fazia feliz. Pra piorar, sua desorganização e seu desagpego faziam-lhe abrir mão, voluntariamente ou não, de quaisquer objetos que pudessem lhe remeter a tais momentos. Ele quase não tinha fotos ou cartas e as poucasque guardara estavam esquecidas há tempos.
O jeito então era viver qualquer sentimento como um acontecimento extraordinário, independentemente da veracidade dele. A dificuldade era o principal atrativo em qualquer evento. Ele gostava dos relacionamentos mais difíceis, das empregos mais cansativos. Ele gostava de prolongar e intensificar o sofrimento dos rompimentos, abondonos e decepções, só por saber que eles haveriam de acabar um dia. A alegria, então, durava semanas e ele a aproveitava até a última gota. Parecia louco, dançava e cantava pela rua afora e ria sozinho constantemente. Costumava sentir dores nas bochechas de tanto rir.
Ultimamente estava tudo diferente. A dor e a mágoa estavam prestes a acabar definitivamente e ele ainda não tinha encontrado algo em que pudesse mergulhar denovo. Não havia encontrado ninguém que lhe oferecesse desafio interessante. Sem sentimentos exacerbados, estava tudo em equilíbrio, então.
Ele tinha se tornado aquilo que fingira ser durante toda a vida. Ele chegou aonde queria e não sabia aonde estava.

10/07/2010

Desapego

Você era sol e eu queria luz. Era chuva e eu precisava de água. Éramos começo, novidade. O primeiro doce do pacote, a primeira mordida de uma boca com fome. E eu era faminta. Saboreava a vida como um tempero exótico. Eu era a cega que voltava a ver, e você era a primeira tonalidade. Enfim, éramos um doce. Um doce problema. Porque o problema de toda novidade é que o novo tem validade.

Curta. Não importa o quanto o sentimento seja legítimo: se é novo, uma hora fica velho. Com o tempo, cria artrites, os ossos enfraquecem, e como nas pessoas, o coração falha. Às vezes entope, às vezes corre. Mas tem vezes que pára. Hoje eu quis entender porque é que o meu desacelerou. Se era antes capaz de parar o tempo, decretar a paz e jurar estabilidade, hoje negou a si mesmo. Não porque era superficial, nem porque não aguentou o tranco. Sinceramente, eu nem sei bem o por quê. Só sei que hoje eu quis um pouco mais de mim e um pouco menos de você.

Não sei se chamo isso de fracasso, vulnerabilidade ou se é só uma lição pra me fazer te dar valor quando tudo não parecer mais tão seguro. Sou vulnerável às mudanças do tempo e não tenho imunidade contra o desinteresse. Ninguém tem. Ninguém que teve um brinquedo, uma música favorita ou um sentimento extraordinário saberia eternizar o impulso do início. A insatisfação, muitas vezes, é o que faz as coisas andarem. E desta vez, ela me faz andar para um lado contrário ao teu.

Por mais que a contraditória aqui seja eu. Ou que as palavras tão firmes de antes hoje pareçam poeira. Se até a dona natureza, que é sábia, tem mudanças de estações, eu - que sei tão pouco de tudo - acho que também posso ter. E posso criar meu próprio tsunami se bem entender. Correndo o risco sim, de parecer volúvel. Mas nunca me entregando à mediocridade que é viver com um coração resignado. Ou de oferecer amor em um tom apagado. Se é vida o que você me propõe, considere a missão cumprida. Quanto mais inexplicável tudo parece, mais eu me sinto viva.

fonte: http://blogdamilena.blogspot.com/2008/07/desapego

01/07/2010

DAILY MÍLLOR: LIBERDADE SEGUNDO MILLÔR


Millôr Fernandes, no antigo Pasquim (e em que época!), também discutia essa tal liberdade:

"A liberdade é a condição (e por que não a condução?) fundamental do homem livre.

Sacou? Aquele negócio de ir-e-vir. Peripatético às pampas. Largueza, ensancha e a ânsia de imensos descampados. Tamos aí. Como dizia Herbert Stengley - escritor que estou inventando neste momento - que maravilhoso arcaísmo é a liberdade. (...) Pois todo homem nasce livre, não é mesmo? Naturalmente dependente do pai, da mãe, da classe social e dos acasos genéticos.

Mas decora logo a tabela dos direitos e deveres, faz as contas, e, se leva vantagem, cai de pau em cima dos outros. É assim que é, pô, não vem com essa não.

Ser livre, enfim, é bom notar, não é ser libertado. "Eu te dou toda liberdade", tá na cara, é restrição máxima. Evita, nego. E dobra à esquerda. (...) Será a liberdade apenas uma nostalgia? Uma colagem mal feita de fatos nunca acontecidos? A política da esperança, já, assim, meio desesperada? Uma simples omissão dos poderes vigentes? O Fla x Flu do Possível contra a Aventura? O condicionamento total é a liberdade?"