17/06/2009

Ser resiliente

Ao longo dos anos a ciência tem-se interrogado sobre o fato de que certas pessoas têm a capacidade de superar as piores situações, enquanto outras ficam presas nas malhas da infelicidade e da angústia que se abateram sobre elas. Por que certos indivíduos são capazes de se levantar após um grande trauma e outros permanecem no chamado fundo do poço, incapazes de, mesmo sabendo não ter mais forças para cavar, subir tomando como apoio as paredes desse poço e continuar seu caminho?
A biologia defende o ponto de vista de que cada ser humano é dotado de um potencial genético que o faz ser mais resistente que outros. A psicologia, por sua vez, dá realce e importância das relações familiares, sobretudo na infância, que construirá nesse individuo a capacidade de suportar certas crises e de superá-las. A sociologia vai fazer referência à influência do entorno, da cultura, das tradições como construtores dessa capacidade do individuo de suplantar as adversidades. A teologia traz uma perspectiva diferente pela própria subjetividade transcendente, uma visão outra da condição humana e da necessidade do sofrimento como fator de evolução espiritual: o célebre “dar a outra face”.


Contudo, foi o cotidiano das pessoas que passam por traumas, que realmente atravessam o vale das sombras, o que realmente atraiu a curiosidade de cientistas do mundo inteiro. Não são personagens de ficção que se erguem após a grande queda; são homens, mulheres, crianças, velhos, o indivíduo comum do mundo que retoma sua vida após a morte de um filho, a perda de uma parte de seu corpo, a perda do emprego, doenças graves, físicas ou psíquicas, em si mesmo ou em alguém da família, razões suficientes para levar um individuo ao caos. Esses que são capazes de continuar uma vida de qualidade, sem auto-punições, sem resignação destruidora, que renascem dos escombros, esses são seres resilientes.
A psicologia tomou essa imagem emprestada da física, trata-se da capacidade dos materiais de resistirem aos choques. Segundo dicionário Aurélio, é a propriedade de pela qual a energia armazenada em um corpo deformado é devolvida quando cessa a tensão causadora de tal de formação elástica. Definiu-se então resiliência como a capacidade do indivíduo lidar com problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas - choque, estresse, etc. - sem entrar em surto psicológico. Resiliência é a capacidade concreta de retornar ao estado natural de excelência, superando uma situação critica.

"É A ARTE DE TRANSFORMAR TODA ENERGIA DE UM PROBLEMA EM UMA SOLUÇÃO CRIATIVA."

Não se é resiliente sozinho, embora a resiliência seja íntima e pessoal. Um dos fatores de maior importância é o apoio e o acolhimento, feito em geral por um outro individuo, e essencial para o salto qualitativo que se dá. Alguns autores nomearam essas pessoas: Flash chamou-o mentor de resiliência; Cyrulnik chamou-o tutor de resiliência; muito antes Bolwby chamou-o figura de apego.
Essa linha de pensamento só vem a reafirmar o que tenho dito discretamente em vários dos meus últimos posts: Não é possível viver (bem) sozinho." Na verdade isso nunca foi novidade. Quem nunca se pegou cantando em algum momento da vida o célebre verso de Tom Jobim: "É impossível ser feliz sozinho..."?
Mas ao estudar o evento da resiliência conclui o que já sabia e tanto esperava. Apesar do vínculo, não se forma um mentor/tutor/figura de apego durante a resiliência. Não se pode dizer que alguém vai ser a partir de agora esse individuo que vai chegar para operar o milagre. A resiliência é, na verdade, o resultado de intervenções de apoio, de otimismo, de dedicação e amor, idéias e conceitos que entram sorrateiramente nas ciências como causa e efeito, intervenção e resultado, hipótese e tese de que as relações intra e interhumanas são relações que ultrapassam o rigor do empirismo para encontrar o acaso.
Não estamos presos, graça a Deus, ao estigma imposto durante a infância. Tampouco seremos somente fruto do meio onde vivemos. Nosso destino também não está traçado por estrelas ou genes. Somos universos em constante expansão e não termos sido resilientes no passado, não nos impede de sermos resilientes no futuro.
Viver é ter esperança. E caminhar. Sempre existem possibilidades.

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